Escolas Médicas do Brasil

Sergipe: Crise entre a classe médica e o governo estadual

 25/07/2010

 

Publicado em: 25/07/2010 19:24:56
CONCEITO QUE PÕE EM DÚVIDA ÉTICA MÉDICA PROVOCA CRISE ENTRE A CLASSE E O ESTADO

O documento protocolado no Conselho Federal de Medicina, sob nº 5050/2010, do Governo do Estado de Sergipe, com o objetivo de obter apoio para a criação do Campus de Saúde na cidade de Lagarto, provocou uma crise que agitou a classe médica do Estado, manifestada através de "Esclarecimentos à População", divulgado nas páginas de jornais da imprensa de Aracaju.

Através do Conselho Regional de Medicina do Estado de Sergipe, assinada pelo seu presidente, médico Henrique Batista e Silva, o Cremese diz que estimula e apóia os investimentos do Governo na melhoria e ampliação da rede de atenção à saúde da população. Entretanto, ao mesmo tempo, expõe preocupação com conceitos postos neste documento, que considera agressivo - "gratuita e espontaneamente" - aos profissionais da saúde em geral e, em particular, aos médicos.

A gota d'água foi um parágrafo da Justificativa do pedido de apoio, elaborada pela Secretaria da Saúde, cujo ofício de encaminhamento ao Conselho Federal de Medicina tem assinatura do governador Marcelo Déda (PT), em que diz o seguinte: "Outro tema fundamental a ser enfrentado é a atitude dos profissionais de saúde em geral, e dos médicos em particular, em suas práticas profissionais. Essas guardam um grau de degradação dos valores éticos e falta de compromisso com o cuidado aos pacientes, configurando uma prática médica degradada, que atua, por um lado, com um paradigma científico defasado e, por outro, com uma prática técnica e ética não comprometida com o cuidado do paciente".

Desprezo - O Cremese considerou que o documento despreza "todos aqueles profissionais, que lutam diuturnamente contra a morte junto aos seus pacientes, em hospitais públicos desaparelhados, vivendo verdadeiro caos administrativo, como comprovado em sucessivas fiscalizações conjuntas realizadas pelo Conselho Regional de Medicina/SE e o Ministério Público Estadual".

Considera também que o documento atinge, "em flagrante falta de bom senso e justiça", o curso de Medicina da Universidade Federal de Sergipe, que em 2011 fará 50 anos de relevantes serviços prestados ao Estado, responsável pela formação de 64% dos médicos em atividade em Sergipe, "lançando-lhe a pecha descabida e injusta de uma prática médica degradada, com um paradigma científico defasado, com um Hospital Universitário que nem sempre tem uma integração efetiva com o Sistema Único de Saúde (SUS)".

Segundo ainda a nota do Cremese, "nesta diatribe raivosa, tenta justificar a criação do novo Campus de Saúde em Lagarto, o qual, afirma, resolveria magicamente todos os problemas éticos, científicos, de carência de médicos e da fixação dos mesmos no interior".

Formação adequada - A Cremese diz ainda que "o Conselho Federal de Medicina é favorável à abertura de Escolas Médicas somente em locais que justifiquem a necessidade social e condições de formação adequada, dentre ela a existência de Hospitais Universitários de padrão respeitável".

Deixa claro que o Conselho "é contrário à abertura de Escolas Médicas de segundo e terceiros níveis, visando a formação de profissionais de padrão científico inferior, dirigidos ao atendimento da população mais carente, especializados em padrão SUS e criando um fosso entre duas Medicinas: a de alto nível para os governantes e os ricos e de baixo nível para a população pobre. De modo oposto, apóia sim os investimentos na infraestrutura assistencial que está por demais necessitada".

Esclarece - No dia seguinte à nota divulgada pelo Cremese, a Secretaria da Saúde e a Universidade Federal de Sergipe fizeram esclarecimento sobre o documento enviado Conselho Federal de Medicina, alegando que fora "difundido trecho que, apartado do contexto original em que foi discutido por um lamentável equivoco, pode ser considerado ofensivo à categoria médica".

Aproveitam para pedir desculpas formais aos médicos pelo ocorrido e "ratificam que as ideias expressas sobre o assunto no trecho mencionado não refletem o pensamento das instituições envolvidas, que entendem e prestigiam a importância do médico para a sociedade".

Conclui que atualmente "o documento que solicita ao Conselho Nacional de Saúde a aprovação do Campus de Saúde de Lagarto, intitulado 'Projeto Pedagógico do Curso de Medicina', reflete o apreço e o respeito dessas instituições aos médicos e sua entidades representativas, reconhecendo o seu desempenho ético na assistência à saúde e na formação de novos profissionais".

Clima - O documento elaborado pela Secretaria da Saúde contém apenas três laudas e nela constam outros itens que deixaram os médicos contrariados. Sábado (24), ao entregar todos os documentos ao Faxaju Online, um médico influente junto à Cremese disse que os  seus colegas continuam ressentidos com o conceito emitido pelo Governo à classe, para justificar o pleito de uma Faculdade de Medicina na cidade de Lagarto.

Consideraram que o pedido de desculpas formulado pela Secretaria de Saúde e a própria Universidade Federal de Sergipe aconteceu depois que os médicos repudiaram o que estava contido na Justificativa enviada ao Conselho Nacional de Medicina e que, pela simplicidade com que foi tratado o assunto, se constituiu apenas numa forma de acalmar a classe médica, "atingida gratuitamente", sem que isso acrescentasse qualquer argumentação para a obtenção de apoio para a instalação do curso.

Segundo um dos médicos - pediu omissão do nome porque a Cremese é quem está tratando do assunto - "certamente o governador Marcelo Déda não tenha responsabilidade e nem faz coro ao que diz o documento, porque deve ter assinado o ofício de encaminhamento, confiando na Justificativa por técnicos da Secretaria da Saúde do Estado".

 

 

 


TAGS