Escolas Médicas do Brasil

O resgate da relação médico-paciente

 20/02/2007

 

Déborah Pimentel - Médica e Psicanalista
O resgate da relação médico-paciente
12-02-2007 10:03

'Os pacientes gostam de se sentir co-responsáveis pelas decisões que envolvem sua saúde e quando o médico conversa, esclarece, orienta, há uma maior aderência ao tratamento e, portanto, mais chances de sucesso terapêutico'

 

Frente a um gigante avanço do conhecimento e inovações tecnológicas, ligados inclusive à Medicina, vive-se simultaneamente um momento ímpar de transformações sociais com novos comportamentos dos indivíduos cada vez mais conscientes dos seus direitos e reinvidicando-os com mais rigor em um exercício de autêntica cidadania. Nada mais natural que estas questões resvalassem para múltiplos campos das relações humanas, inclusive a relação médico-paciente.

Muitas vezes os pacientes formalizam queixas no Conselho Regional de Medicina (CRM) contra o seu médico e ficam frustrados por achar que por corporativismo o profissional foi absolvido e o processo arquivado. Os pacientes ignoram que o CRM para dar inicio ao processo ético-profissional tipificará o erro de acordo com o Código Ético Profissional que elenca como causas, imprudência, imperícia ou negligência. Claro que erros existem e por eles os médicos devem ser responsabilizados, mas nem sempre aquilo apontado pelo paciente é caracterizado como falha na qualidade do atendimento ou uma lesão efetivamente comprovada como decorrente de uma má ação médica. Isso não é proteção aos médicos como muitas vezes se pensa. Mas alguma coisa aconteceu do contrário este médico não seria denunciado. É sobre esta questão que se pretende aqui analisar.

Os elementos mais importantes para se evitar denúncias são agir com rigor técnico e ético. Apesar do diploma ser um elemento de comprovação de habilidade técnica ele não é o suficiente, pois ele apenas aponta para um conhecimento adquirido. Já a ética, é de caráter não assegurado por documentação, por conseguinte é subjetiva e mais abrangente, e precisa não só ser exercitada dia a dia, mas capaz de ser percebida nos pequenos gestos e atos do cotidiano profissional e pessoal. Ou seja, o diploma e uma boa especialização não são o bastante para exercer a Medicina. É preciso que este médico esteja consciente de todos os preceitos hipocráticos e queira honrar a sua arte dentro dos princípios deontológicos que a sua prática requer.

Com ou sem culpa, para o médico não há nada mais perturbador do que ser citado por erro profissional. Um processo desta natureza fere narcisicamente o sujeito que por sentir-se humilhado se deprime, se isola socialmente e é capaz de adoecer, física e emocionalmente, comprometendo inclusive a sua performance técnica. Importante que este médico saiba que existe uma maneira de se fazer profilaxia da denúncia e evitar constrangimentos e sofrimentos de ambas as partes: investir na sua relação com o seu paciente.

Dentre as questões éticas de maior interesse nesta análise, a relação médico-paciente é, certamente, a mais vulnerável. É conclusão do Conselho Federal de Medicina que a falha na comunicação é a razão principal que motiva as denúncias contra médicos. Este ruído na comunicação que se estabelece entre o profissional e o paciente é na maior parte das vezes por responsabilidade do primeiro que, por pressa, ou por sentimentos de superioridade ou até arrogância, acha perda de tempo ouvir adequadamente o paciente e familiares, não valoriza determinadas questões ou opiniões, não se disponibiliza e torna-se inacessível e ainda, não oferece esclarecimentos acerca do diagnóstico, tratamento ou prognóstico. Em última instância, as relações não são humanizadas como deveriam.

Os pacientes gostam de se sentir co-responsáveis pelas decisões que envolvem sua saúde e quando o médico conversa, esclarece, orienta, há uma maior aderência ao tratamento e, portanto, mais chances de sucesso terapêutico. Médicos que se preocupam com a comunicação e a relação com seus pacientes acaba oferecendo um atendimento de melhor qualidade. E não há dúvidas que se o paciente tiver a percepção de um interesse genuíno do seu médico em lhe oferecer o melhor, técnica e emocionalmente, acolhendo dúvidas e angustias, em situações de fracasso de uma terapêutica ou frente a um possível erro ou acidente médico, sua decepção é minimizada e até neutralizada.

Conclui-se que o médico precisa estar tecnicamente habilitado para o exercício profissional, mas também precisa praticar uma Medicina mais humanizada, única forma de atender adequadamente as demandas dos pacientes e evitar esta avalanche de denúncias profissionais.


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