Escolas Médicas do Brasil

2008 e a saúde - por A.C.N.Nassif

 31/01/2008

OPINIÃO | OPINIÃO DO DIA 2 publicado na edição impressa de 01/01/2008  - Jornal GAZETA DO POVO - Curitiba-PR

2008 e a saúde

  

Quando da votação da CPMF comentou-se em Brasília, em tom de brincadeira, que o ministro José Gomes Temporão “teria dormido rico e acordado pobre”. É que o total do dinheiro de tal “contribuição”, pouco antes teve seu destino formalmente prometido para a Saúde. No entanto, com a derrubada da CPMF este “sonho” acabou.

Na verdade, a CPMF era uma contribuição combatida por muitos. Entre outras coisas porque, boa parte desse dinheiro tinha um destino pouco transparente e diferente para o qual foi proposta. Além do mais, não se pode prorrogar indefinidamente o provisório. Entraria para a história dos desmandos.

Contudo, apesar de não ter mais a CPMF, o governo já conta com a aprovação da Desvinculação de Recursos da União (DRU), o que lhe permitirá gastar livremente 20% da receita da União. Em troca, comprometeu-se a não editar nenhum pacote fiscal e algumas coisas mais.

No entanto, o governo, com a DRU aprovada, não deve nem pensar em desviar a verba que, hoje, obrigatoriamente vai dela para a Saúde, porque estaria selando um fim trágico para o atendimento público à Saúde no Brasil. Se antes, o Ministério da Saúde justificava o caos reinante pela falta de recursos, agora, com certeza, nem terá com o que se responsabilizar. Tudo será culpa da CPMF.

Da mesma forma, o atendimento dos serviços públicos de saúde a população carente e aos miseráveis, que gira em torno de 100 milhões de brasileiros não pode mais continuar sendo crítico e deplorável. Os hospitais da rede pública, os hospitais de Clínicas ligados às universidades, os postos de saúde estão sendo sacrificados e muito, com prejuízos evidentes para a população. “Um descalabro de dar náusea cívica”, no dizer de Joelmir Beting. Até o ensino da medicina está comprometido, porque é nos hospitais ligados as universidades que os acadêmicos passam pelos ciclos de internato nos dois últimos anos do curso.

Nessa mesma linha, o professor Adib Jatene, ainda quando Ministro da Saúde, em um de seus artigos publicados terminava assim: “A luta pela saúde é a luta pela própria vida, que tem de ser respeitada como valor absoluto. Custa caro, mas precisa ser paga.” Por essa e outras razões é que este setor precisa ter recursos suficientes e ser prioridade de governo.

Algo precisa ser feito com serenidade e inteligência para a solução desse imbróglio. Nossa opinião é que, talvez se consiga fazer “desse limão uma limonada”. Basta que ambos os lados decidam iniciar de fato, com vontade cívica, a tão esperada discussão e aprovação da reforma tributária. Nesta, estaria a oportunidade de incluir um imposto exclusivo para a Saúde, com porcentual de arrecadação financeira suficiente para se poder realizar uma verdadeira “revolução positiva” nos serviços públicos de saúde em nosso país.

O saudoso presidente americano J.F. Kennedy nos deixou um exemplo de conscientização quando enfatizou: “A saúde de um povo é uma das chaves para seu futuro, para sua vitalidade econômica, para a moral e eficiência dos cidadãos... Saúde é problema de uma nação”.

Acreditamos que ninguém, em sã consciência poderá prever o que vai acontecer com a Saúde em 2008. Resta-nos, pois, torcer para que ela, pelo menos, não fique pior do que está hoje. E que o melhor aconteça, para que todos possam ver resgatada a dignidade do atendimento a saúde e as necessidades da população.

Para isso, o governo precisa conscientizar-se como o saudoso presidente Tancredo Neves, que quando em visita à Associação Paulista de Medicina disse: “A miséria e a injustiça são os grandes aliados da morte, e não adianta distribuir pastilhas a quem tem fome, nem pregar preceitos de higiene a quem está mergulhado nas trevas da ignorância”.

Antonio Celso Nunes Nassif, doutor em Medicina, foi presidente da Associação Médica Brasileira. acnnassif@netpar.com.br


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