Escolas Médicas do Brasil

Ser médico no Brasil - por A.C.N.Nassif

 17/03/2007

SER MÉDICO NO BRASIL

       Todos os anos, nas diversas escolas e universidades do país, o curso de maior procura nos vestibulares é o de medicina. Ficamos pensando: o que leva cada um desses jovens ao desejo de ser médico? Será o carisma que a profissão transmite ao lidar com a doença, com a dor, com a cura, com a vida?  Será seu aspecto sacerdotal, ou o respeito que esperam receber no futuro, dos doentes, da população em geral?
        Que é uma profissão nobre e cativante, não se discute. Mas hoje em dia será que é reconhecida e recebida por todos, como antigamente? Será que, no Brasil de hoje, com tanta agressão à dignidade médica, tanto achincalhe, tanta perda de respeito, ainda vale a pena ser médico? 
        Mesmo que as respostas não sejam agradáveis, ainda assim temos que acreditar no futuro, porque, "ser médico é uma extraordinária vocação, concedida a poucas pessoas para o divino exercício de desvendar males e curar o homem".

         Que atitudes se espera do médico no exercício da sua profissão? Que traços demonstram nele uma postura ética e profissionalismo? Quais são as qualidades que se espera tenha o médico, diante da estrutura econômica, social e cultural de nossos tempos, caracterizada por um vertiginoso desenvolvimento científico-tecnológico? Três atitudes são essenciais:

Bondade. Buscar o bem do paciente é o primeiro traço essencial. Pode-se resumir com a frase: “tratas a teu paciente como quiseras que te tratasses a ti”. Hipócrates falava de “filantropia” o amor ao semelhante. Sem esta virtude, o médico será frio e desumanizado e não contará com as características de equilíbrio e discernimento necessários para atuar contra a dor e a doença do paciente.

Sabedoria. É o segundo traço e implica na aquisição permanente e abundante de conhecimentos de qualidade, tanto teórico-científicos como os relacionados com habilidades práticas e aspectos formativos mais profundos. Este conhecimento dá ao médico consciência da sua real preparação, assim como de suas limitações. A sabedoria implica em não deixar-se deslumbrar por tecnologias ou procedimentos inovadores. Examinem o paciente como um todo. Só assim poderão discutir com a máquina em caso de discordância.

Humanismo. É primordial respeitar a pessoa além da sua condição social, sua cultura, posição política, religião e valores, independentemente do nosso pensamento. Do contrário, a ciência deixaria de estar a serviço do Ser Humano. Esta terceira qualidade inclui muito especialmente o respeito à privacidade e individualidade do paciente. Referir-se a ele pela doença que o aflige ou pelo número de sua cama pode violentar justamente seus sentimentos de Ser Humano. Não custa nada tratá-lo pelo seu nome.

Quando o médico possui equilibradamente estas três virtudes – bondade, sabedoria e humanismo – ele exerce dignamente a medicina e se encaixa dentro do comportamento ético que honra nossa profissão. A ética provem do grego “ethos”. Significa “costume, hábito” e, como tal, não é teoria, mas uma atitude de vida que se aprende no dia a dia.

Com o tempo se chega a uma Ética Natural e a prática destas virtudes faz surgir um comportamento diário que transcende à própria ética, para que surja em nosso interior o amor pelo Ser Humano e um profundo desejo de ajudá-lo.

Da mesma forma, a relação médico-paciente deve constituir-se numa conversa individual, cheia de consciência profissional, intimidade e confiança, insubstituíveis por intervenções desumanizadas ou meramente administrativas.

Escutem, conversem, acolham as aflições com paciência. Maimonedes já dizia no século XII: “Numa consulta que dure uma hora, durante cinqüenta minutos ausculte a alma do paciente; nos dez minutos restantes, o examine.”.

Atualmente, não é fácil ser médico em nosso país.   A começar pelo “festival” de criação de cursos de medicina, que continua, (já estamos com 168 escolas médicas). Milhares de brasileiros estão na Bolívia, em Cuba e na Argentina, cursando medicina.  Aqui, as escolas médicas em funcionamento aproveitam brechas na lei e acertos políticos, para aumentarem o número de vagas para o 1°. ano. (Hoje são exatamente 17.423 vagas). Assim, é possível prever que o Brasil venha ter cerca de 350 mil médicos a partir do ano 2.010.

Mas, há que se ter esperança em dias melhores, em um novo país. Ter esperança de que isso venha acontecer, significa acreditar no que uma pensadora chamada CHRISTIANE escreveu:

Creia amigo, que a primavera há de vir, que o inverno terá fim, que a vida será bela nesse país que teremos construído”...

Creia ainda, amigo, que oferecendo a nossa alegria àqueles que têm fome e frio, poderemos curar a doença e a miséria, nesse país que teremos construído...

E creia ainda, amigo, que nossas forças unidas farão brilhar o sol nas noites escuras, para devolver a todos o sabor da esperança, nesse país que teremos construído...”.

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Prof. Dr. Antonio Celso Nunes Nassif, médico, professor da UFPR, ex.presidente da Associação Médica Brasileira                    Março de 2007


 

 

 
 

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