16/05/2014
Entre as empresas de serviços seguramente as que produzem saúde são as que têm mais dificuldade em medir seus resultados devido a sua estrutura e produtos serem complexos, complicados, de alto risco e alto custo, o que se justifica (ao menos) pelo seguinte:
1- A mão de obra como fator de produção é composta por no mínimo 14 categorias profissionais de saúde, legalmente constituídas, se desdobrando em mais de 340 subespecialidades, estes profissionais são colocados no mercado por diversos centros formadores, fator complicador para a padronização do atendimento;
2- A Classificação Internacional de Doenças possibilita milhares de diagnósticos, a tabela de procedimentos do SUS possui nada menos do que 4.468 produtos, que vão de uma simples consulta a um transplante. Nenhuma outra indústria/empresa produz variedade de produtos como a saúde, o que dificulta gerir grande diversidade de insumos;
A fraqueza do sistema reside também na baixa interatividade entre os bancos de dados do SUS e das Secretarias de Saúde
3 - Os produtos da saúde são entregues por programas (saúde do idoso, da mulher, como exemplo) que comportam serviços (clínicos, cirúrgicos, etc.) em unidades de saúde (AME, UPA, hospitais, cerca de três dezenas de modelos), por vezes formando redes (urgência etc.) que necessitam de formação e técnica inerentes à qualidade do atendimento ao paciente, apresentando métodos diferenciados de planejamento, organização, direção e avaliação;
4 - É preciso economia de escala para que os profissionais sejam habilitados a fazer determinados procedimentos os mais complexos, o que não ocorre em unidades com baixa demanda;
5 - A gestão e o financiamento do sistema ocorrem nas três esferas, federal, estadual e municipal, que nem sempre estão alinhadas em um mesmo partido político, criando disputas, dificultando entendimentos quanto a prioridades, inviabilizando bons resultados;
6 - A saúde individual e coletiva e a produção dos serviços de saúde estão relacionadas com a demografia, a geografia, a educação, a economia, a cultura, ao clima; fatores ligados a mudanças comportamentais que demandam investimento e tempo para sanar influências negativas e trazer aquelas positivas, e as ferramentas utilizadas para tanto são ainda primitivas, o que impossibilita o bom sucesso dos produtos.
De modo simplista espera-se que os resultados das empresas da área de saúde sejam de boa qualidade, alta produtividade e custos que permitam atender o maior número de cidadãos no menor tempo possível.
Qualidade significa que além da competência técnica que previna doença ou cure, permita atendimento humanizado, entendendo-se que este é muito mais que afagos, mas sim, conhecimento técnico e administrativo, ética e respeito ao cidadão incluindo-se acesso geográfico (caminho fácil), acesso físico (unidades a disposição) e cultural (comunicação entre profissional e cliente) com assertividade e rapidez.
Protocolos clínicos e procedimentos operacionais padrões fazem parte da sua composição, bem como eficácia e avaliação/prevenção de riscos.
Produtividade significa uso de tecnologia, economia de escala, logística, pessoal capacitado, unidos por técnicas administrativas que permitam com segurança uma melhor relação no número de atendimento por profissionais de saúde, procedimentos por equipamentos, operações por sala, consultas por consultórios, viabilizando o sistema, evitando ocorrências de filas (listas de espera), mal atendimento, pacientes em macas. Entre os conceitos que ajudam concretiza-la e medi-la estão efetividade e atuária.
Custos traduzem-se na combinação de fatores de produção, utilizando-se de processos que manipulam insumos, apoio de equipamentos, dentro de áreas físicas específicas, realizados por técnicos e administradores com técnicas e métodos, com componentes de qualidade e produtividade equilibrados permitindo diagnosticar e tratar problemas de saúde ou promoção da saúde para maior número de pessoas.
É a base para formação de preços, para a orçamentação. Enfim, financiamento correto só ocorre com conhecimento de custos operacionais unitários ou por procedimentos. Não há como justificar a sua não realização requerendo apenas atenção e trabalho, não configurando tarefa de extrema complexidade. A eficiência é um dos conceitos mais próximos do controle de custos.
Todo processo de produção em saúde exige padrão e para isto é preciso medir e comparar, portanto há necessidade de informações epidemiológicas, demográficas, geográficas, atuariais, de produção, e é neste ponto que reside a fraqueza do sistema, na fragilidade das informações e na baixa interatividade entre os bancos de dados do SUS e do Sistema Supletivo, bem como entre secretarias de Estado e municipais de saúde. A gestão da informação como ferramenta administrativa pode contribuir de forma definitiva com uma visão holística do meio ambiente, da estrutura, dos processos e dos resultados.
O tão esperado Cartão SUS, que conteria as informações individuais dos cidadãos além de acompanhá-lo ao longo da vida agilizaria o atendimento e a regulação dos serviços de saúde, também é dependente de um potente sistema de informação que ainda não se encontra à disposição.
Somente quando as empresas de saúde utilizarem modelos informacionais adequados às suas características de gestão e do contínuo aprimoramento e desenvolvimento de recursos humanos haverá bom sucesso na regulação do sistema, sustentabilidade, governança, sendo possível o aumento da produtividade e melhora na qualidade elevando o índice de satisfação dos clientes.
As políticas de saúde pública necessitam gestão por resultados, mas para que isto ocorra é imprescindível informações consistentes por intermédio de pesquisas operacionais que devem servir para subsidiar/orientar os centros formadores de profissionais para que o sistema de saúde realmente produza efeitos positivos sobre a saúde individual e coletiva. Não se faz ensino sem pesquisa e pesquisa sem medir qualitativa e quantitativamente as operações do sistema.
Olímpio J. Nogueira V. Bittar é médico especialista em Saúde Pública